Revista Globo Rural

IDEIAS

AINDA HOJE TEMOS TERRAPLANISTAS, GRUPOS ANTIVACINAS E A NEGAÇÃO COMPLETA, POR PARTE DE MUITOS, DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Luiz Josahkian é zootecnista, professor de melhoramento genético e superintendente técnico da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ)

Nunca na história o acesso ao conhecimento científico foi tão fácil como atualmente. De fato, olhando em perspectiva – e descontados o obscurantismo medieval e o maniqueísmo contemporâneo –, nós avançamos, embora pudéssemos estar mais à frente. Ainda hoje temos terraplanistas, grupos antivacinas e a negação completa, por parte de muitos, das mudanças climáticas.

No campo da genética, em especial, os confrontos éticos e religiosos são um caso à parte. Em 1948, só para exemplificar, Stalin declarava a biologia evolutiva e a genética ilegais na antiga União Soviética, instigado por seu guru, Trofim Lysenko, que postulava que as sementes “aprenderiam” a sobreviver nas estepes geladas.

Não levou muito tempo para a fome grassar os campos soviéticos. Como esse, muitos avanços científicos foram tolhidos pela imposição de tabus e crenças apadrinhados pela política ou amplificados pela mídia.

A história da genética está pontilhada de momentos assim, e hoje os organismos geneticamente modificados (OGMs) são um bom exemplo. Um OGM, por definição, é aquele cujo material genético tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética.

Sua liberação para o mercado é um processo complexo e demorado, que poderia ser mais célere se fosse desvinculado de narrativas tecnicamente desqualificadas, anacrônicas e descoladas da realidade.

No Brasil, existe uma legislação rigorosa para a manipulação de genes das espécies, assim como existe um órgão colegiado de assessoramento do governo federal, a CTNBio, que atua no estabelecimento de normas para atividades que envolvam OGMs e derivados.

Os OGMs são uma realidade, como, por exemplo, algumas vacinas, plantas transgênicas (que representam a maior parte do milho, soja e algodão produzidos no Brasil), microrganismos usados na indústria e terapias para doenças genéticas.

Recentemente, a CTNBio liberou para consumo o salmão transgênico, sete anos depois da rigorosa Food and Drug Administration, dos EUA. É o primeiro produto a chegar às gôndolas após a breve vida do tomate Savr flavr, um OGM dos anos 1980 que prometia maior tempo de prateleira e cuja sobrevida foi efêmera.

O salmão geneticamente modificado atinge o tamanho de comercialização em 18 meses, a metade do tempo convencional, consumindo até 25% menos ração. Seu novo DNA conta com dois genes de dois outros peixes. Um, relativo ao hormônio de crescimento do salmão chinook (Oncorhynchus tshawytscha), que cresce bem mais, e outro gene da enguia Zoarces americanus, que codifica um promotor de proteínas anticongelamento que o permite crescer no inverno.

Na medicina, terapias gênicas também foram liberadas pela CTNBio, tais como drogas para pacientes acometidos por malignidades de células B específicas, mieloma múltiplo, distrofia da retina hereditária e atrofia muscular espinhal.

As possibilidades são infinitas, mas demandam muitas pesquisas, muitos investimentos e a supressão dos obstáculos sem fundamentação científica. As tecnologias de edição genética sinalizam ser o ápice da Revolução Verde iniciada nos anos 1960, mas enfrentam nossa lentidão na capacidade de gerenciá-las.

SUMÁRIO

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2023-03-06T08:00:00.0000000Z

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