CARTA AO LEITOR

Enquanto assistimos a uma guerra entre os poderes e os cidadãos preocupando-se mais com voto impresso ou eletrônico nas próximas eleições, milhões de jovens brasileiros mal sabem o que está acontecendo e pagam diariamente o preço pela omissão de quem deveria lhes garantir o básico: saúde, saneamento, água potável, educação. São crianças que vivem longe dos centros urbanos, em busca de seus sonhos e de um dia tentar uma disputada vaga na universidade. Mas, para chegar lá, precisam superar os mais variados obstáculos. Nesta edição especial, mostramos o cotidiano de adolescentes, famílias e educadores que moram em zonas rurais e fazem malabarismos para conseguir estudar ou ensinar.

Se com uma infraestrutura precária já era difícil levar e manter esses brasileiros dentro da sala de aula, em um ano de pandemia, sem acesso a uma internet minimamente estável e com desemprego recorde, as desigualdades cresceram, assim como a distância entre esses jovens e as oportunidades de uma vida melhor. Para contar as histórias que você confere nas páginas a seguir, fomos a Quixadá, no interior do Ceará, onde vivem Vinicius, Pedro Vitor, Venâncio e Sarah Lorrany, alguns dos personagens desta edição. Eles moram a 40 quilômetros da cidade e, como a vacina ainda não chegou à região, não sabem quando vão voltar à escola para aprender, encontrar seus colegas e professoras. Estas dizem que já estão acostumadas a ouvir dos seus alunos perguntas sobre a data de retorno e sofrem por não terem respostas a dar. Isso quando a internet não cai no meio da aula, o que é bastante comum. Também fomos à zona rural de Santiago (RS) para conhecer a rotina de estudos de Guilherme Martins, de 12 anos. Filho de produtores, ele só não ficou sem material escolar durante o isolamento porque seu pai ia buscar os livros a cavalo na escola. Na prova sobre como não desistir da educação, esses brasileiros das zonas rurais merecem nota máxima. Já o país precisa melhorar – e muito – as suas notas e, principalmente, fazer seu dever de casa. Em um Brasil cujo ministro da

Educação é capaz de dizer que “universidade deveria, na verdade, ser para poucos, nesse sentido de ser útil à sociedade”, fica fácil entender as seguidas reduções de investimento na área. Em um ano de pandemia, o Brasil gastou 10% menos em educação do que em 2019, segundo a ONG Todos Pela Educação. Para 2021, o Ministério da Educação (MEC) projeta novos cortes. Se, no ano passado, o dinheiro já foi pouco, neste ano, o setor deve receber R$ 4 bilhões a menos dos recursos obrigatórios. Qual a importância do rural para este país se boa parte do futuro que nele habita está completamente desconectada do mundo? As crianças da zona rural precisam dessa resposta.